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Por: Salmo Vieira
Fotos: reprodução/EPA
Pela primeira vez, um texto acordado na cúpula climática da ONU apela a todos os países para que façam uma transição energética para se distanciar dos combustíveis fósseis — e não que eles sejam eliminados, como muitos governos queriam
O texto reconhece a necessidade de reduções profundas, rápidas e sustentadas se a humanidade quiser limitar o aumento da temperatura global em 1,5ºC.
A sala de conferências da COP irrompeu em aplausos, com abraços e largos sorrisos nos rostos das delegações, quando o acordo foi anunciado.
“Juntos encaramos a realidade e colocamos o mundo na direção certa”, disse o presidente da COP28, Sultan Ahmed Al-Jaber.
Em nenhuma conferência anterior as nações concordaram com um afastamento conjunto de petróleo, gás e carvão.
Muitos países esperavam que o texto aprovado nesta quarta-feira (13/12) em Dubai apontasse a “eliminação gradual” do uso de combustíveis fósseis em todo o mundo. A eliminação gradual ou progressiva exigiria que os países reduzissem gradualmente a quantidade que produzem e utilizam até chegarem a zero.
O acordo, no entanto, apela à “redução” do uso destes combustíveis- isso significa a diminuição do quanto um país depende de combustíveis fósseis, sem a exigência de uma meta de zero.
Houve outras críticas. Samoa, por exemplo, disse que as nações insulares, ilhas gravemente atingidas pelas alterações climáticas, “não estavam presentes” quando o texto foi aprovado.
A queima de combustíveis fósseis provoca o aquecimento global, colocando em risco milhões de vidas. Até hoje, os governos nunca concordaram coletivamente em parar de usá-los.
Em fala após o anúncio do acordo, a ministra do Meio Ambiente do Brasil, Marina Silva, disse que os países desenvolvidos deveriam assumir a liderança na transição dos combustíveis fósseis.
“O desafio de cumprir esta missão 1,5ºC dependerá do compromisso de todos”, disse Marina.
Ela afirmou que o Brasil está satisfeito e honrado em poder ajudar nisso – o Brasil sediará a COP daqui a dois anos, na Amazônia, em Belém.
Análise – Justin Rowlatt, editor de clima
O presidente da COP28 considera este um momento-chave na história. O ponto em que o mundo mudou de rumo e começou realmente a exercer pressão sobre a fonte esmagadora das emissões que aquecem o nosso planeta: carvão, petróleo e gás.
E é realmente um progresso significativo que, pela primeira vez, os combustíveis fósseis e a necessidade de “transição” deles tenham sido incluídos no texto da COP.
Os ativistas dirão que é tarde demais. Mas a união do mundo para reconhecer esse fato terá consequências no mundo real. Você apostaria as economias de sua vida em uma nova usina a carvão depois de hoje?
Mas é verdade que o acordo é fraco em seus fundamentos.
Por quê? Porque a linguagem mais forte que os Emirados Árabes Unidos conseguiram fazer com que o mundo concordasse foi “apelar às partes para contribuírem” para uma série de ações para combater as alterações climáticas.
Eu poderia lavar um único prato e teria “contribuído” para lavar a louça — mas você acha que eu realmente teria feito o suficiente?
Essa falta de intensidade foi reconhecida pelo presidente destas conversações no seu discurso esta manhã. “Agora é com vocês”, disse ele aos delegados.
O sucesso deste acordo tem tudo a ver com a “implementação”, disse ele – quanto da lavagem da louça os países do mundo realmente decidem fazer.
Que diz o acordo?
Para os progressistas, há sinais de que a era dos combustíveis fósseis está chegando ao fim. Para os produtores de petróleo há ambiguidade suficiente para que possam continuar produzindo.
As promessas de triplicar as energias renováveis e a exigência de novos planos de redução de carbono também são significativas para muitos.
Confira alguns pontos chave do texto:
- Os países irão “contribuir… para a transição dos combustíveis fósseis nos sistemas energéticos de uma forma justa, ordenada e equitativa”.
- Esta é a primeira vez que há uma referência clara sobre futuro de todos os combustíveis fósseis (carvão, petróleo e gás) num texto da COP. Não inclui qualquer texto sobre a “eliminação progressiva dos combustíveis fósseis”.
- Há um reconhecimento de que as emissões globais provavelmente atingirão o pico antes de 2025 – e que para as nações em desenvolvimento isso poderá ocorrer mais tarde.
- No que diz respeito à adaptação e ao financiamento, a linguagem parece ter sido enfraquecida, com o texto “reiterando” em vez de “solicitando” aos países desenvolvidos que dêem apoio às nações vulneráveis que enfrentam as alterações climáticas.